Dois pontos fundamentais para não se dar mal na cultura japonesa

Depois de algum tempo fora das redes sociais, voltei. Mas desta vez não para somente dizer coisas super legais sobre o Japão, mas para dizer as coisas mais próximas da realidade de um indivíduo comum, desde o perrengue até os micos. Voltei, na verdade, com uma pequena bagagem de mão que pode enriquecer nosso entendimento sobre Japão, Brasil, cultura e, sobretudo, como essa tríade consegue estar tão próxima culturalmente e também tão distante uma da outra.

Para tanto, a conclusão que cheguei e na qual me baseio, digo a vocês desde já:

“Para onde quer que fores morar – fora de seu país de origem -, a cultura local há de dar-lhes tabefes, e muitos”.

Mas, porque sou uma pessoa bem intencionada, pretendo trazer os “tabefes” que eu mesmo levei (e ainda levo) para compartilhar com todos vocês. E vou dizer: são situações engraçadas, deprimentes e, diga-se de passagem, educativas em muitos casos.

Contextualizando os “tabefes”

1) Esses “tabefes” são tecnicamente chamados de: choque cultural.

O choque cultural é o momento quando o indivíduo se depara com a cultura local e pensa: “Ô amigo, você está de sacanagem, né?” ou “Será que esse povo não percebe que…”. É justamente a indignação, a estranheza, a ironia, raiva, indiferença, entre outras características que surgem depois de um certo tempo, que é o ápice desse choque. Mas isso é apenas o começo das “dores”.

2) A compreensão cultural só acontece através de uma análise antropológica.

O termo parece ser meio difícil, mas a ideia é simples: se você está morando num outro país, seu dever é observar como as pessoas como um todo se comportam. Por exemplo: se elas riem quando te atendem na loja, se são fechadas, se conversam com estranhos numa fila, se são educadas, se cumprimentam ou não, entre outros comportamentos.

Essa observação, no entanto, não leva apenas algumas horas, mas pelo menos, de um a dois anos!

Para quê saber disso?

Os tabefes que levei e tenho levado morando aqui no Japão são justamente situações que eu poderia ter evitado se tivesse entendido essas duas premissas acima. Claro que isso não evitará meus tombos futuros, mas certamente ajudará na redução em valores consideráveis.

Exemplificando um dos meus choques

Num belo dia, eu estava conversando com meu chefe – japonês – coisas do trabalho. Ele me explicou diversas regras, de como agir, fazer, entre outras tarefas no serviço.

Depois de ouvir tudo aquilo, havia chegado o momento das perguntas e dúvidas, o que é comum para nós, brasileiros, correto? Errado.

Quando comecei a perguntar o porquê disso e daquilo, ele ficou assustado e passou a me repreender, dizendo mais ou menos “como você ousa questionar, falando dessa forma?”, e prosseguiu repreendendo.

Sem saber o porquê de todo aquele sermão, só fui sacar depois (meses depois) que o questionamento é uma forma de arrogância. Mas a coisa não é tão simples assim. O questionar em si, para o japonês, não é arrogante, mas sim a forma como é feito, em qual momento e para quem.

A cultura japonesa possui muitas, mas muitas etiquetas e formalidades (entro em detalhes nos próximos artigos). Tão logo, o que eu deveria ter feito antes era expressar uma forma adequada para o questionar. Veja esse exemplo de um curtíssimo trecho da conversa:

O que aconteceu:

Chefe: “Você deve fazer isso e aquilo”.

Eu: “Por que?”.

Resultado: Chefe dando sermão.

O que deveria ter acontecido:

Chefe: “Você deve fazer isso e aquilo”.

Eu: “Com licença. Entendi basicamente as explicações. Se me permite, eu poderia tirar algumas dúvidas sobre determinadas lacunas e, se possível, o senhor também me explicar algumas situações que não ficaram tão claras?”.

Resultado: Eu obteria as respostas adequadas, sem sermão.

Viram a diferença? Percebemos, então, que a expressão japonesa exige algumas etiquetas para falar de determinados assuntos dependendo de quem é o interlocutor. E isso é um super choque para nós, estrangeiros. Mas, só em campo mesmo para saber como as diferenças culturais funcionam.

Em breve, vou tratar sobre o choque cultural propriamente dito, que é geralmente com base no gráfico acima.

Para concluir, espero que, através desta coluna, possamos ajudar a todos na compreensão sobre adaptação cultural, seja no Japão ou em qualquer outro país, uma vez que esse desafio é inerente a todos os meios sociais. Portanto, fiquem ligados, pois muitos outros artigos ainda virão!

Yoroshiku! (Essa é uma palavra que não há tradução para o português, mas é um tipo de saudação)