Kodo: conheça a milenar arte da apreciação de incensos no Japão

Conheça mais sobre o Kodo, a milenar arte de apreciação de incensos no Japão e seus ricos significados e cerimônias.

Muitas pessoas já ouviram falar ou tem uma breve noção sobre a cerimônia do chá, o Sado (茶道). Além da cerimônia do chá, outra arte tradicional muito popular é o Kado (華道).

Kado pode ser traduzido como “o caminho das flores” e é mais conhecido como Ikebana, um arranjo de flores japonês muito particular.

Peças para Kodo
Peças para Kodo

Porém poucas pessoas conhecem o Kodo (華道), “o caminho da fragrância/aroma”. Mas a arte da apreciação do incenso está sendo readaptado para outras finalidades, como a gastronomia e aromaterapia.

Pontos históricos

Os primeiros registros do Kodo no Japão remontam o século VII durante o período Nara em rituais budistas.

É interessante notar que o caminho da fragrância surge no Japão, logo após o período Asuka, que foi fundamental para a formação do Japão como uma sólida nação do ponto de vista cultural.

Príncipe Shotoku
Príncipe Shotoku

Graças ao impressionante príncipe Shotoku que trouxe harmonia e ordem a sociedade, implementou o budismo como religião oficial e foi autor da primeira constituição (17 artigos) do país, o Kodo foi possível.

Natureza humana

De acordo com algumas escolas do budismo, o incenso é semelhante a natureza humana. Uma vez aceso, seu aroma se espalha pelos quatro cantos e afetam o mundo, sejam em ações positivas ou negativas.

Para além das ações realizadas por uma pessoa, assim como a vida humana, os incensos chegam ao fim, tal qual qualquer coisa ou ser existente.

Impermanência

A função de um incenso não é apenas perfumar o ambiente com sua fragrância única. Também serve para nos lembrar da finitude da vida e da inevitável impermanência da existência.

Apesar do apreço dos japoneses pelo caminho das fragrâncias, foi apenas durante o período Muromachi, que o Kodo foi formalizado pelo shogun Ashikaga Yoshimasa.

Ashikaga Yoshimasa

Ashikaga Yoshimasa

A pedido do shogun, Sanjonishi Sanetaka, um grande estudioso do período passou a catalogar os aromas dos incensos.

Além disso, criou uma enciclopédia para definir as propriedades de cada uma.

Foi então que o Kodo se tornou cada vez mais comum na vida cotidiana da sociedade japonesa (ainda no período Muromachi).

Aos aromas provenientes dos incensos, foram associados dez virtudes básicas:

  1. Aguçar os sentidos;
  2. Purificação mental e corporal;
  3. Remoção de estados mentais negativos;
  4. Promoção do foco;
  5. Alivia a sensação de solidão;
  6. Cria harmonia mesmo em situações de estresse;
  7. Não sobrecarrega os sentimentos mesmo em grandes quantidades;
  8. Satisfaz mesmo em pequenas quantidades;
  9. Não se desintegra;
  10. Não causa efeitos colaterais negativos no uso diário;

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O caminho das fragrâncias

Imperatriz Suiko
Imperatriz Suiko

Embora o Kodo tenha surgido oficialmente no Japão durante o período Nara, os primeiros incensos no Japão surgiram durante o reinado da Imperatriz Suiko, tia do principe Shotoku.

Rikkoku Gomi

Quanto ao kodo, ele é dividido em um conceito chamado Rikkoku Gomi e pode ser traduzido “como seis países, cinco sabores”

O Rikkoku são seis tipos de madeiras perfumadas encontradas no Japão. São elas Kyara, Rakoku, Manaka, Manaban, Sumatora e Sasora.

Incenso Kyara
Incenso Kyara

Gomi por sua vez representa o sabor do perfume, são eles Amai (doce), Nigai (amargo), Karai (picante quente), Suppai (azedo) e Shio Karai (salgado).

Embora esses conceitos facilitem a compreensão de cada uma das fragrâncias, reconhecer cada uma delas requer anos de treinamento e estudo profundo.

Vale a pena citar uma reflexão de Sun Tzu em uma passagem sobre o Poder Estratégico Militar de sua obra, A Arte Da Guerra:

“[…] As notas não excedem cinco, mas as variações das cinco notas nunca podem ser plenamente ouvidas. As cores não excedem cinco, mas a variação das cinco cores nunca podem ser completamente vistas. Os sabores nunca excedem cinco, mas a variação dos cinco sabores nunca podem ser inteiramente sentidas.”

Considerando essa profunda reflexão de Sun Tzu (um dos principais mestres para samurais, shoguns e generais japoneses), pode-se concluir que dominar essa arte não é para qualquer um.

Além disso, o Kodo foi uma das três principais virtudes que uma mulher deveria possuir no Japão tradicional.

Vivenciando o Kodo

Cerimônia Kodo
Cerimônia Kodo

A prática do kodo não é tão diferente esteticamente dos locais onde são realizados as cerimônias do chá (Sado). A diferença está na proposta da arte em si.

Jogo mental

Kodo
Kodo

Enquanto a cerimônia do chá possui aspectos que envolvem uma participação ativa-passiva, a arte da apreciação dos incensos está mais próximo de um jogo mental.

Nesse jogo, os participantes são convidados a tentarem descobrir quais são as fragrâncias. Isto é, o Rikkoku Gomi de cada incenso apresentado por quem está conduzindo a arte.

Apesar de parecer um jogo de adivinhação, essa sensação é sentida apenas por quem é leigo nessa arte.

Kodo
Kodo

Afinal, muitos japoneses dedicam uma vida inteira sobre o estudo destes aromas. Portanto, o assunto é muito mais sério do que se imagina.

Por se tratar de uma arte e considerando a reflexão de Sun Tzu citado, é preciso levar isso em conta em uma experiência real. Além disso, tratar o kodo com o respeito que toda a arte merece.

O incenso em outras culturas

Utilizar plantas, cascas de árvores e incensos não é uma particularidade exclusiva dos japoneses ou dos budistas.

É muito comum o uso desses perfumes naturais em outras culturas, como a hindi (embora esse seja um termo utilizado apenas por ocidentais), hebreus, árabes, islâmicos e cristãos.

Embora muitos estudiosos entendam que o incenso representa a espiritualidade, de acordo com alguns livros cristãos não canonizados pelo Concílio de Niceia, o incenso representa a natureza iluminada dos seres humanos.

Além disso, há uma grande variedade de incensos ao redor do mundo, cada qual com suas próprias características regionais.

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